segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A moda incomoda



Perdoem-me os moderninhos de plantão, mas poucas coisas são mais “estranhas” do que a moda. Mais por força de circunstâncias profissionais do que por desejo pessoal, circulo em lugares considerados propícios à proliferação dos que a seguem. Onde todos têm a obrigação de parecer diferentes, embora absolutamente padronizados dentro do seu gueto. Trapinhos, sim, trapinhos viram bolsas de grife de estratosférico valor. Cabelos que clamam por uma guilhotina causam suspiros entre seus pares. Botas que se adequariam perfeitamente às lides rurais são exibidas como verdadeiras obras de arte. E o preto! Valei-me, o preto é o Manto Sagrado contemporâneo que todos reverenciam. Uma espécie de cortejo fúnebre esfuziante ocupa os melhores ambientes. Ah, e muito importante: nessas reuniões, precisa-se mostrar certo ar de tédio. Um bocejo discreto sempre é recomendável.

Confesso que me sinto um alienígena quando estou entre essas criaturas pós, ultra, mega-antenadas. O que esperam de você? Sorrisos e elogios a granel. Diga que estão deslumbrantes e seu nome merecerá ser incluído em sua exclusivíssima agenda. Fale qualquer coisa do tipo “que incrível, onde você comprou isso?” e algo parecido com uma iluminação religiosa poderá ser detectada em suas faces. Mas, atenção, você corre o risco de receber um curso intensivo, em dez lições, de como se vestir bem, de como não fazer feio em meio a tanta gente fashion. Você, coitadinho, que ainda se veste como uma pessoa comum, normal, previsível. Que se recusa a pagar mil reais por uma calça. Ou quinhentos por um acessório. Que prefere ficar olhando esse desfile incessante de esquisitices em vez de fazer parte do espetáculo. Olha aí outra palavra adorada por toda a turma: espetáculo. O palco tem de ser deles, de preferência com luzes piscando incessantemente sobre suas cabeças.

Não sei bem por que, mas tenho sentido algo parecido com constrangimento quando testemunho esses simulacros e afetações que muitas festinhas estimulam. É tudo tão artificial, tudo sem pudor algum. Os gestos exagerados, as vozes que gritam, ultrapassando o ambiente, até alcançar a rua. Comecei falando em moda e agora percebo que o que mais me incomoda é o jeito com que muitos se expõem nesses grupos considerados de vanguarda. Aliás, ainda posso usar esse vocábulo? Tudo acontece tão rápido que o novo já nasce velho. Todos citam muito o estilo, mas é o que menos tenho visto. Elegância é privilégio de poucos. Não pode ser comprada em lojas, já o sabemos. Tenho algumas amigas que poderiam subir em qualquer passarela com garantia de sucesso. Mas raramente são vistas farfalhando por aí. Resisto em usar a palavra fauna, mas é nela que penso toda vez que desenho mentalmente alguns locais onde os que ditam a moda fazem seus rasantes. Se eu conseguisse ser um pouco menos crítico certamente me divertiria mais. Preciso treinar o papel do alienado feliz. Só acho difícil ceder a essas tentações que desfalcam consideravelmente a nossa conta bancária.

Pergunta: será que se permitem repetir algum look? A autocensura não deve ver com bons olhos esse pecado estético. Todos precisam se sentir exclusivos, sob pena de terem seus nomes riscados da próxima lista vip. Certo, certo, sei que o mundo ainda não virou uma Daslu com ares de Dallas, embora muitas vezes pareça. Mas não estamos muito longe disso, penso. Por ora são nichos, só isso. O futuro nos dirá. Cuidar de si, praticar moderadamente a vaidade é outra coisa, senhores.

Para que todos não entremos nessa espécie de obsessão, uma rápida olhada no espelho antes de sair de casa pode ser de grande valia. Não deixe que ninguém determine o que deve ser usado ou descartado. É possível até seguir as tendências da estação, mas sem perder de vista que não vale para todos e todas, indiscriminadamente. Porque senão vira ditadura. Desde que aprendemos a nos enfeitar para seduzir, a moda ganhou um status quase divino. Mas não esqueça esse mandamento básico: ela evapora rapidamente. O ridículo, nem sempre.

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