terça-feira, 30 de outubro de 2012

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A moda incomoda



Perdoem-me os moderninhos de plantão, mas poucas coisas são mais “estranhas” do que a moda. Mais por força de circunstâncias profissionais do que por desejo pessoal, circulo em lugares considerados propícios à proliferação dos que a seguem. Onde todos têm a obrigação de parecer diferentes, embora absolutamente padronizados dentro do seu gueto. Trapinhos, sim, trapinhos viram bolsas de grife de estratosférico valor. Cabelos que clamam por uma guilhotina causam suspiros entre seus pares. Botas que se adequariam perfeitamente às lides rurais são exibidas como verdadeiras obras de arte. E o preto! Valei-me, o preto é o Manto Sagrado contemporâneo que todos reverenciam. Uma espécie de cortejo fúnebre esfuziante ocupa os melhores ambientes. Ah, e muito importante: nessas reuniões, precisa-se mostrar certo ar de tédio. Um bocejo discreto sempre é recomendável.

Confesso que me sinto um alienígena quando estou entre essas criaturas pós, ultra, mega-antenadas. O que esperam de você? Sorrisos e elogios a granel. Diga que estão deslumbrantes e seu nome merecerá ser incluído em sua exclusivíssima agenda. Fale qualquer coisa do tipo “que incrível, onde você comprou isso?” e algo parecido com uma iluminação religiosa poderá ser detectada em suas faces. Mas, atenção, você corre o risco de receber um curso intensivo, em dez lições, de como se vestir bem, de como não fazer feio em meio a tanta gente fashion. Você, coitadinho, que ainda se veste como uma pessoa comum, normal, previsível. Que se recusa a pagar mil reais por uma calça. Ou quinhentos por um acessório. Que prefere ficar olhando esse desfile incessante de esquisitices em vez de fazer parte do espetáculo. Olha aí outra palavra adorada por toda a turma: espetáculo. O palco tem de ser deles, de preferência com luzes piscando incessantemente sobre suas cabeças.

Não sei bem por que, mas tenho sentido algo parecido com constrangimento quando testemunho esses simulacros e afetações que muitas festinhas estimulam. É tudo tão artificial, tudo sem pudor algum. Os gestos exagerados, as vozes que gritam, ultrapassando o ambiente, até alcançar a rua. Comecei falando em moda e agora percebo que o que mais me incomoda é o jeito com que muitos se expõem nesses grupos considerados de vanguarda. Aliás, ainda posso usar esse vocábulo? Tudo acontece tão rápido que o novo já nasce velho. Todos citam muito o estilo, mas é o que menos tenho visto. Elegância é privilégio de poucos. Não pode ser comprada em lojas, já o sabemos. Tenho algumas amigas que poderiam subir em qualquer passarela com garantia de sucesso. Mas raramente são vistas farfalhando por aí. Resisto em usar a palavra fauna, mas é nela que penso toda vez que desenho mentalmente alguns locais onde os que ditam a moda fazem seus rasantes. Se eu conseguisse ser um pouco menos crítico certamente me divertiria mais. Preciso treinar o papel do alienado feliz. Só acho difícil ceder a essas tentações que desfalcam consideravelmente a nossa conta bancária.

Pergunta: será que se permitem repetir algum look? A autocensura não deve ver com bons olhos esse pecado estético. Todos precisam se sentir exclusivos, sob pena de terem seus nomes riscados da próxima lista vip. Certo, certo, sei que o mundo ainda não virou uma Daslu com ares de Dallas, embora muitas vezes pareça. Mas não estamos muito longe disso, penso. Por ora são nichos, só isso. O futuro nos dirá. Cuidar de si, praticar moderadamente a vaidade é outra coisa, senhores.

Para que todos não entremos nessa espécie de obsessão, uma rápida olhada no espelho antes de sair de casa pode ser de grande valia. Não deixe que ninguém determine o que deve ser usado ou descartado. É possível até seguir as tendências da estação, mas sem perder de vista que não vale para todos e todas, indiscriminadamente. Porque senão vira ditadura. Desde que aprendemos a nos enfeitar para seduzir, a moda ganhou um status quase divino. Mas não esqueça esse mandamento básico: ela evapora rapidamente. O ridículo, nem sempre.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Arquivos mentais


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  • Depois de uma série de pequenos e turbulentos desastres domésticos, meu amigo desabafa: “Só pode ser olho grande, inveja, sei lá. Só isso para explicar tanta coisa ruim acontecendo na minha vida.” Fazemos uma rápida retrospectiva e descobrimos que esses incidentes estão muito mais relacionados a uma sucessão de descuidos, ao acaso, do que a algo maléfico planejado por terceiros. O mundo não conspira contra nós, acredite. Fiquei com a impressão de não tê-lo convencido totalmente, embora suas convicções talvez tenham sido sutilmente arranhadas. No caminho para casa, pensei no quanto esse tipo de crença é recorrente. Poucos escapam dessa armadilha. Não sou um dos felizardos, embora em diversas circunstâncias eu consiga trocar o embotamento por algumas doses de consciência. Mas nem sempre. Quando algo dá errado, é mais fácil culpar o vizinho, o suposto inimigo, o desafeto. Assim nos isentamos da responsabilidade. E há todo um entorno social que endossa essa postura. Aliás, há um mercado bastante lucrativo que estimula esse tipo de pensamento.

    Algo anda mal com você? Recorra a um pai de santo, a uma cartomante, faça uma macumba. Reze. Pague para sair dessa, se preciso for. Nada contra. Pode ser um recurso legítimo, mas o efeito se parece mais com o de um placebo. O que a gente não costuma fazer é acessar o nosso arquivo mental e tentar descobrir onde está a falha, a desconexão. Porque é certo que quando tudo parece desandar as causas estão bem mais próximas do que imaginamos. Mas é difícil fazer esse mapeamento e assumir culpas. Mais: admitir certos boicotes, que costumam resultar da fragilidade típica de quem se habituou a se sentir vítima de tudo e de todos. As palavras redentoras são essas: os outros. Com isso não preciso fazer nada além de lamentar o meu infortúnio, pobre ser chicoteado pelo destino. E não importa o tamanho da injustiça que sofremos. Na contabilidade final, permanece a certeza de que não merecíamos passar por isso.

    Talvez a porta de entrada para o mundo adulto se encontre exatamente aí: na percepção de que somos os artífices da maioria das coisas que acontecem conosco. É difícil traduzir isso através da linguagem. Pode ser que a expressão correta seja simplesmente essa: assumir nossos atos. Mesmo quando os efeitos são desastrosos e os fatores que os provocaram pareçam desconhecidos. Ao ampliar as investigações, descobrimos que bem e mal são conceitos que não transcendem o nosso próprio eu. E é dentro do movimento sutil de cada dia que vamos encontrar respostas. Ou, pelo menos, uma tranquilidade que exonere as culpas. E a pior delas é a terceirizada. Os pilares de muitas religiões são colocados exatamente nesse terreno. E quem sou eu para negar o conforto que conseguem dar a tantos órfãos de um sentido para a existência.

    Permanecer de olhos abertos não é fácil. Mas se fechar em dogmas equivale a colocar um par de algemas em si mesmo. Até somos capazes de continuar caminhando, mas uma boa parte da nossa liberdade foi perdida. Eu continuo me deseducando. E nesse processo está a vontade de recuperar alguns campos que não estão definitivamente contaminados pela lógica e pelos precários cinco sentidos. Existe algo lá fora, afinal? Não sei, mas me agrada a ideia de conseguir suportar esse hiato de solidão, ancorado na coragem e no desafio. Continuo caminhando no deserto, mas com a convicção de que uma terra prometida poderá ser avistada algum dia.

    Voltando ao amigo perseguido por forças ocultas, posso dizer que hoje, passados alguns meses, uma camada muito tênue de comprometimento já se torna perceptível nele. Disse-me que chama isso de efeito bumerangue. De alguma maneira, as coisas voltam. Há uma circularidade impressionante em tudo. E para descobrir isso, não recorreu a nenhum expediente de ordem espiritual. Ele simplesmente está aprendendo a difícil arte da autoanálise. Nem sempre é muito bonito o que encontramos nessas escavações. Mas é a única maneira de parar de gritar contra Deus e o mundo sobre aquilo que nos acontece. Virtude e recompensa nem sempre andam juntas. Superstição e fracasso, sim.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012


Ponto de impacto fulminante de um recomeço

Se quer finjir que esse desprezo é verdade,
da pra notar,seu sorriso esconde lágrimas de saudade
Se fosse mesmo somente uma mentira
aceite os fatos,o que eu coloquei em você,nada tira

Com a clareza das mudanças,tudo pode acontecer
e o anjo que eu cultivei fez um demônio nascer,
o medo anda lado a lado com a insegurança,
e a cada passo assustado,cai no esquecimento a lembrança

Mas guerreiros foram feitos pra suportar a dor,
apenas com a motivação de que nada supera o amor.
Tudo que é perfeito não passa de ilusão,
e se amar for um defeito,não existe perfeição.

Toda ação tem sua consequência num momento
e o mal que passou hoje,vem de volta com o vento
só olhos de dor conseguem ver o mal,
e o erro da incompreenção é sempre fatal.
Não existe mal tão grande que não va acabar,
nem bem tão intacto que sempre va durar.

A vida tem o costume de tentar nos derrubar,
e poucos tem o dom de cair,levantar e recomeçar...
quantas vezes forem necessárias até o sonho esperado alcançar.
Sidney Lobo Jr