domingo, 22 de novembro de 2009

DIGA-ME COM QUEM ANDAS


Não há neutralidade na vida. O encontro mais fortuito pode determinar uma mudança radical em nossa forma de ver e pensar o mundo. Os amigos que escolhemos, nossos amores e mesmo aquele breve contato com desconhecidos vão moldando nossa maneira de ser. Portanto, há que se ter cuidado ao tecer a teia de relacionamentos com a qual vamos nos construindo como seres humanos.

Pessoas melancólicas que se aproximam acabam reforçando essa visão da realidade. Que poderia ser só uma referência, algo cambiante e que acaba mudando ao sabor das circunstâncias. A cada dia somos apresentados a desafios que exigem de nós não apenas coragem, mas sobretudo um olhar claro sobre as decisões que precisamos tomar. A resposta será fortemente influenciada por aqueles que atravessaram o nosso caminho. Sempre. O que somos resulta do que sentimos. É uma prisão, mas pode ser provisória e depende bastante de atenuarmos o que fica comprometido pela presença do outro.

Pessoas felizes, igualmente, procuram reforçar o modo como fazem sua leitura da existência. É o velho jogo de espelhos, só que muitas vezes acabamos confundindo o real com a imagem refletida. E, um belo dia, quase sem perceber, estamos agindo exatamente igual ao vizinho ranzinza que só vê o lado negativo de tudo ou, ao contrário, ao colega que parece ter acoplado nele um pequeno motor que gera alegria. Como a maioria de nós oscila ora para um lado, ora para outro, não custa nada prestar mais atenção àqueles que, em última instância, também são responsáveis por aquilo em que nos transformamos.

Como não nos é dada a possibilidade de viver mais do que uma vida, fica difícil saber o que poderíamos ter sido. “Eu sou assim, fazer o quê?”, dizemos para nós mesmos, e essa sentença determinista acaba encerrando um orgulho de vencedor. Mas o fato é que muitas coisas podem ser alteradas. Seja aos cinco ou aos 80 anos. E isso costuma acontecer à revelia de nossa vontade e mesmo do nosso lado racional. O molde começa a ser trabalhado cedo. Erramos ao só olhar para ele depois que já está seco.

Não tenho dúvida: eu seria outro, completamente outro, se não tivesse sido influenciado pela maneira de ver e sentir de todos com os quais convivo. Eles são responsáveis pela minha história pessoal. Mais do que isso: minhas noções éticas, morais, afetivas e mesmo religiosas provêm desse entrelaçamento de ideias que ocorre o tempo todo. Eu não sou, eu resulto. Em outras palavras, o velho ditado “diga-me com quem andas e eu te direi quem és” não é apenas uma simplificação. Ele traduz uma verdade inexorável: acabamos nos parecendo sempre com aqueles que estão próximos de nós. Como Zelig, o famoso personagem criado por Woody Allen, adquirimos muitas características alheias e formamos uma bricolagem que define nossa identidade.

A pluralidade de relacionamentos nos enriquece e possibilita uma perspectiva mais ampla sobre tudo o que praticamos. É bom evitar a armadilha de só procurar os iguais.

Criamos dependência, precisamos dos outros. A nossa responsabilidade é apenas parcial quando nos entregamos às derrotas ou reagimos positivamente às alegrias. Todos respondem pelo que somos ou deixamos de ser. Ninguém passa impunemente por esse contágio emocional.

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